Crônicas-

Sídrome da Pressa

A neurastenia no trânsito está se tornando, literalmente, coisa de louco. O sujeito vai tirar o pai da forca, desvairado, costurando, na via rápida, escapando por um triz de um veículo aqui, desviando de outro ali. Ele pode. Mas fica furioso se alguém se atreve a passar para a sua faixa, na frente dele, mesmo que a manobra tenha sido feita em segurança. Não se conforma com isso, em "ser passado para trás". Curiosamente, não se trata da premente necessidade de chegar a casa logo, para um compromisso qualquer. Não é nada disso. Muitas vezes, é fora do expediente, e o jantar não vai sair antes de duas ou três horas. Mas, o motorista urbano está com pressa. Uma aflição, uma urgência doentia. Psicótica. Inexplicável. É como se fosse atraído por um imã, por uma força irresistível em determinada direção, que nem sempre é a própria residência ou local de trabalho. Pode ser a oficina mecânica. Pode ser a casa de um amigo, a padaria, a barbearia, o consultório médico ou dentário. Não importa. O que ele quer, é chegar logo ao destino. Nem que para isso tenha que matar ou morrer no trânsito! Como diz a sabedoria de pára-choque de caminhão: Prefere perder a vida em um minuto, a perder um minuto na vida. Isso mesmo! Basta analisar sob o enfoque matemático. Qual a diferença, qual o "lucro", em minutos, que obteve aquele apressadinho inconseqüente, que ziguezagueou, deu fechadas, esbravejou, xingou, fez gestos obscenos, cometeu, enfim, desatinos de toda a ordem, em relação àquele que obedeceu as normas do trânsito e da boa educação? Só sei de uma coisa: o tempo gasto no mesmo trajeto é quase idêntico. Mas, com uma diferença enorme: este último não correu os incalculáveis riscos da pressa. É menor, muito menor, para o motorista cuidadoso e tranqüilo, o perigo de perder, em questão de segundos, o patrimônio que amealhou durante uma existência. Você já havia pensado nisso? Pois é bom ir pensando, no caso de ser vencido em eventual ação de reparação de danos. Sem falar na possibilidade de ir parar na cadeia, sim senhor, no caso de atropelamento ou colisão com lesões corporais ou morte.

Acidente? Qual nada! Isto só acontece com os outros.

Tão raro, hoje em dia, pessoas que brindem com um sorriso, na rua, o semelhante! Pessoas que façam um gesto de bondade, com o semblante desarmado, deixando que o motorista do lado passe para a faixa delas. Reduzir a velocidade ao avistar crianças. Ter a generosidade de esperar o transeunte atravessar a rua, a sua frente, sem ameaçá-lo com a buzina ou com o acelerador. Diacho! Que diferença faz esse gesto de cavalheirismo (alguns segundos, apenas), no cômputo geral do trajeto? Uma insignificância!

Olhe ao redor, e verá um formigueiro de automóveis, dispostos em fileiras paralelas, conduzidos por indivíduos carrancudos e mal-humorados, que parecem estar de mal com a vida. Estressados. Histéricos. Infelizes. Alguns, dependurados em seus telefones celulares, porque não podem perder um minuto na vida! Ah! Se, por qualquer motivo (para dar um aviso, ou coisa assim), você der uma buzinadinha, sai de baixo! Poderá levar um tiro na cara, desferido pelo motorista da frente.

Ridículo ver cidadãos de bem, de certo nível social e financeiro, perderem a razão e a compostura em episódios lamentáveis no trânsito! Gente sem educação parando em fila dupla (às vezes, tríplice), para apanhar e deixar o filho na escola. Buzinaços. Ronco ensurdecedor de motores! Gritaria. Uma balbúrdia infernal! Isto não pode continuar assim! Alguém tem de fazer alguma coisa! E pensar que vem mais indústria de veículos por aí.

Motorista, você (só você!) pode fazer alguma coisa para reverter a situação e tornar razoável a sobrevivência na selva do trânsito. Antes de sair de casa, faça uma reflexão, uma oração, se preferir. Prometa a si mesmo que não vai deixar-se contaminar pela síndrome da pressa que assola nossa pequena aldeia ecológica. Que vai fazer gentilezas, desarmar o semblante e sorrir para as pessoas que lhe pedirem licença. Lembre-se: você não está com pressa! Não se aflija. Vai chegar a tempo. Não se desespere. Alivie o pé do acelerador. Veja que lindo sol derramando-se em maravilhosa festa de luzes e de cores sobre seu caminho. Repare o riso encantador estampado na face daquela criaturinha adorável, no veículo ao lado. A vida é bela.

Sorria. E haverá paz no trânsito nosso de cada dia. Amém!

Albino de Brito Freire

Crônicas

Página inicial